por Karla Muniz Barreto Oton
Falar sobre o cuidar é, sobretudo fazer uma reflexão do lugar onde se mora, onde se constrói as relações mais íntimas e complexas do ser, onde se recebe os primeiros cuidados - a família.
A família é ainda o lugar onde se constrói identidades, estruturas emocionais, vínculos eternos. É onde podemos tocar, preocupar-se e envolver-se afetivamente, um compromisso emocional que acarreta responsabilidade prazerosa, espontânea e plena. Quem foi cuidado nesses termos geralmente cuidará de outros, dando continuidade nesse processo consigo mesmo em sua caminhada.
A palavra cuidado segundo os clássicos de filologia deriva do latim cura, que se escrevia coera e era usada em condições de amor e de amizade. Expressava, portanto uma atitude de cuidado, preocupação e de inquietação pela pessoa amada ou objeto de estimação. Esse cuidado existe apenas quando se atribui valor e importância. É o aconchego da alma, o mimo que se precisa para olhar para si e para o outro com ternura.
Cuidar é um princípio que deve norteiar a vida, que marca pessoas, que traz esperança. Rollo May falando acerca do cuidado disse que somente ele nos permitiria resistir ao cinismo e à apatia que nos cercam hoje. Estamos vivenciando situações onde é "cada um por si e Deus por todos", na família cada um possui sua TV, seu PC, sua denominação; na igreja, os relacionamentos se limitam ao momento do culto; no trabalho se mantém uma postura individualista, devido a competição; em todos os setores a sociedade vive uma superficialidade assustadora que desumaniza e embrutece as relações.
Se olharmos para os ensinamentos do Senhor Jesus, podemos perceber que Seu cuidado foi muito além, excedeu a si próprio, a sua família e aos seus discípulos, estendeu-se à aqueles que eram desprezados, aos enfermos, aos excluídos, para aqueles que não tinham ninguém a ouvir seus gemidos, ou alguém para estender a mão e colocá-los em um tanque para serem curados; muitas vezes seus discípulos apesar de andarem com Ele, eram ainda indiferentes e insensíveis as necessidades do próximo; repreenderam pessoas como aquele homem que gritava: "Jesus filho de Davi tem misericórdia de mim", eles não compreendiam que a misericórdia(cuidado) do Mestre excedia aos preconceitos, tabus, legalismos, superficialidades, descaso e até mesmo a lei. Leonardo Boff enfatiza que Jesus fez da misericórdia a sua ética.
Madre Teresa ao deixar o convento para cuidar dos mais pobres dos pobres disse: "Dá Cristo ao mundo, não o mantenhas para si e ao fazê-lo, usa tuas mãos", "a mão que toca cura porque leva amor, carinho, afeto, devolve a confiança, oferece acolhida e manifesta cuidado, renascendo a humanidade perdida".
Amar ao próximo como a si mesmo, é cuidar de si, é deixar-se ser cuidado, é dar acesso ao Espírito de Deus e ao próximo para tocar em feridas ainda não cicatrizadas, como debilidades, pecados, tendências, medos, segredos; nesse exercício de humildade as traves do nosso olho já tão insensível começam a ser retiradas, para só então nos vermos e vivermos em plenitude, e assim retirar o argueiro daqueles que nos cercam, cuidando com-paixão para que vejam plenamente o Mestre do Amor. Lembramos-nos ainda que Jesus veio para os doentes, portanto somente estes serão por Ele cuidados para assim cuidarem plenamente da sua casa.
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