sábado, 25 de setembro de 2010

A esperança vence a desilusão


por Ricardo Barbosa de Souza

Mesmo que as notícias piorem cada dia, eu ainda continuarei a ter a esperança de um dia ver este país ser governado por gente decente

Às vezes, me vem uma vontade enorme de chutar o balde! Penso em desistir, parar de lutar por um país melhor, sonhar com políticos altruístas, abnegados, que ajam como verdadeiros sacerdotes da nação. Minha vontade é de anular meus votos nas próximas eleições, pois ninguém os merece. Parece que o melhor, o mais sensato, é viver alienado, como muitos; não dar a mínima para a política, ignorar o país e cuidar da minha vida.

Confesso que diante de situações como as que estamos vivendo, tudo isso me passa pela mente. Manter a esperança quando a gente se sente traído é como querer permanecer de pé com as pernas quebradas. Por mais que nos esforcemos, não dá – não há mais nada em que se apoiar. Então, sem a utopia que nos motiva, jogamos a toalha e nos entregamos ao cinismo, aquela descrença que toma conta da alma e nos rouba os sonhos mais nobres.

Tais sentimentos passam por mim e chegam a me fazer considerar que este é, provavelmente, o melhor caminho. Mas, em algum momento, parece que enfrentam uma espécie de resistência interna. Eles não chegam a corromper totalmente meu coração e minha mente; lentamente, volto a me recompor e a reconsiderar a fonte dos meus sonhos e esperanças. Vejo então que elas não podem se sustentar num alicerce tão frágil e efêmero como o das ambições insanas pelo poder.

O apóstolo Paulo, ao referir-se à fé de Abraão, disse que o patriarca “esperava contra a esperança”. Abraão cria numa promessa que, embora teoricamente impossível, lhe fora feita por Deus. As chances de acontecer aquilo que o Senhor lhe havia prometido eram mínimas – para dizer a verdade, nenhuma; mas ele creu, e sua fé lhe encheu de esperança. E o que dizer de Habacuque, um profeta de Deus preocupado com seu país e o futuro de sua gente? Aflito, ele perguntou a Deus: “Até quando, Senhor, terei que conviver com a injustiça e opressão?” A princípio, qualquer um esperaria uma intervenção divina eliminando a iniqüidade e trazendo de volta a retidão. No entanto, a resposta de Deus surpreende o profeta: os conflitos, ao invés de diminuírem, iriam aumentar. Ele, sem entender, prefere calar-se e permanecer atento ao que Deus iria fazer.

Habacuque nos dá uma das lições mais preciosas sobre esperança. Diante da devastação, da corrupção, da injustiça e do sofrimento, ele não a perdeu. Na sua oração, o profeta diz: “Mesmo não florescendo a figueira, e não havendo uvas nas videiras; mesmo falhando a safra de azeitonas, não havendo produção de alimento nas lavouras, nem ovelhas no curral nem bois nos estábulos; ainda assim, eu exultarei no Senhor e me alegrarei no Deus da minha salvação. O Senhor, o soberano, é a minha força; ele faz os meus pés como os do cervo; faz-me andar em lugares altos.”

De onde Abraão e Habacuque tiraram sua confiança? Os fatos que presenciaram conspiravam contra qualquer esperança. Abraão não tinha motivos para acreditar que, em sua velhice, pudesse ainda ter filhos. Parecia coisa de lunático, projeção da sua carência. Da mesma forma foi com Habacuque. Esperar o quê? O exército dos caldeus estava marchando sobre sua terra. Anunciava-se uma devastação total, uma crise sem precedentes. No entanto, ambos creram na ação misteriosa e soberana de Deus.

O apóstolo Paulo afirma que permanecia sempre disposto, cheio de esperança e trabalhando arduamente porque, mesmo que seu homem exterior – presenciando as circunstâncias políticas e sociais, a falência dos projetos humanos ou as limitações da ciência – sofresse os golpes fatais da desilusão, seu homem interior, aquele lugar onde a fé nutre a esperança, ia se renovando dia após dia. A crise moral, política e ética que vivemos hoje serve de alerta para nos fazer ver de onde temos alimentado a esperança. O slogan da campanha vitoriosa do presidente Lula dizia que “A esperança venceu o medo” e encheu muita gente de ânimo, Mas hoje, o medo e a desilusão rondam de novo a esperança. Olhamos para o futuro e não enxergamos nada; as possibilidades de mudança evaporaram. Na melhor das hipóteses, quem sabe, poderemos sonhar com um governo que seja mais esperto, que esconda melhor as tramas do poder, os caixas dois e os favores políticos. Talvez poderemos também sonhar com uma reforma política, destas para inglês ver, que servirá apenas para, mais uma vez, iludir eleitores sonhadores.

Mas a esperança é nutrida pela fé, e não fé em um partido, um político com discurso moralista, religioso ou ideológico. Nossa esperança, hoje e sempre, é sustentada pela Palavra de Deus, pela certeza de que o Senhor reina e que conduz todos as coisas para o fim que ele mesmo determinou. É por causa dele e do seu Reino que continuamos a lutar incansavelmente até que haja justiça. É por causa da fé que podemos dizer como Habacuque – ainda que o poder continue corrompendo os mais nobres ideais; ainda que a maioria dos políticos não mereçam nossa confiança; ainda que malas de mensalões continuem circulando nos corredores do poder; ainda que a mentira permaneça na boca daqueles que juraram dizer só a verdade; mesmo assim, eu exultarei no Senhor e me alegrarei no Deus da minha salvação.

Não pretendo chutar o balde, muito menos me juntar aos alienados. Mesmo que as notícias piorem cada dia e o mercado dê sinais de agitação e intranqüilidade, ou ainda que aqueles em quem um dia eu confiei me decepcionem e os sonhos que um dia acalentei se frustrem, eu ainda continuarei a sonhar e ter a esperança de um dia ver este país ser governado por gente decente. Líderes que sejam servos do povo, que aspirem ao sacerdócio e não ao poder, que lavam os pés uns dos outros e não se curvam diante daqueles que oprimem e amam a iniqüidade e não a justiça. Continuo tendo esta esperança porque sei em quem tenho crido, e sei que somente nele minha esperança repousa.

Ricardo Barbosa de Souza
é conferencista e pastor da Igreja Presbiteriana do Planalto, em Brasilia

domingo, 19 de setembro de 2010

"Antes, cuida da tua casa e de ti mesmo"

por Karla Muniz Barreto Oton

Falar sobre o cuidar é, sobretudo fazer uma reflexão do lugar onde se mora, onde se constrói as relações mais íntimas e complexas do ser, onde se recebe os primeiros cuidados - a família.

A família é ainda o lugar onde se constrói identidades, estruturas emocionais, vínculos eternos. É onde podemos tocar, preocupar-se e envolver-se afetivamente, um compromisso emocional que acarreta responsabilidade prazerosa, espontânea e plena. Quem foi cuidado nesses termos geralmente cuidará de outros, dando continuidade nesse processo consigo mesmo em sua caminhada.

A palavra cuidado segundo os clássicos de filologia deriva do latim cura, que se escrevia coera e era usada em condições de amor e de amizade. Expressava, portanto uma atitude de cuidado, preocupação e de inquietação pela pessoa amada ou objeto de estimação. Esse cuidado existe apenas quando se atribui valor e importância. É o aconchego da alma, o mimo que se precisa para olhar para si e para o outro com ternura.

Cuidar é um princípio que deve norteiar a vida, que marca pessoas, que traz esperança. Rollo May falando acerca do cuidado disse que somente ele nos permitiria resistir ao cinismo e à apatia que nos cercam hoje. Estamos vivenciando situações onde é "cada um por si e Deus por todos", na família cada um possui sua TV, seu PC, sua denominação; na igreja, os relacionamentos se limitam ao momento do culto; no trabalho se mantém uma postura individualista, devido a competição; em todos os setores a sociedade vive uma superficialidade assustadora que desumaniza e embrutece as relações.

Se olharmos para os ensinamentos do Senhor Jesus, podemos perceber que Seu cuidado foi muito além, excedeu a si próprio, a sua família e aos seus discípulos, estendeu-se à aqueles que eram desprezados, aos enfermos, aos excluídos, para aqueles que não tinham ninguém a ouvir seus gemidos, ou alguém para estender a mão e colocá-los em um tanque para serem curados; muitas vezes seus discípulos apesar de andarem com Ele, eram ainda indiferentes e insensíveis as necessidades do próximo; repreenderam pessoas como aquele homem que gritava: "Jesus filho de Davi tem misericórdia de mim", eles não compreendiam que a misericórdia(cuidado) do Mestre excedia aos preconceitos, tabus, legalismos, superficialidades, descaso e até mesmo a lei. Leonardo Boff enfatiza que Jesus fez da misericórdia a sua ética.

Madre Teresa ao deixar o convento para cuidar dos mais pobres dos pobres disse: "Dá Cristo ao mundo, não o mantenhas para si e ao fazê-lo, usa tuas mãos", "a mão que toca cura porque leva amor, carinho, afeto, devolve a confiança, oferece acolhida e manifesta cuidado, renascendo a humanidade perdida".

Amar ao próximo como a si mesmo, é cuidar de si, é deixar-se ser cuidado, é dar acesso ao Espírito de Deus e ao próximo para tocar em feridas ainda não cicatrizadas, como debilidades, pecados, tendências, medos, segredos; nesse exercício de humildade as traves do nosso olho já tão insensível começam a ser retiradas, para só então nos vermos e vivermos em plenitude, e assim retirar o argueiro daqueles que nos cercam, cuidando com-paixão para que vejam plenamente o Mestre do Amor. Lembramos-nos ainda que Jesus veio para os doentes, portanto somente estes serão por Ele cuidados para assim cuidarem plenamente da sua casa.

segunda-feira, 13 de setembro de 2010

Bem-aventurados os que choram


por Israel Belo de Azevedo

Embora o gênero predileto da Bíblia seja a poesia, plena de figuras de linguagem e de imagem, seus textos são sobre a vida concreta, para situações concretas. Ela está cheia de narrativas de pessoas, homens e mulheres, que choraram diante de certas situações na vida, como também ocorre conosco.

Chorar é um desses verbos que acompanham o ser humano (Eclesiastes 3:4). Quando chegamos à luz do mundo, choramos, aos berros. Quando perdemos pessoas que nos enlutam com sua partida, choramos, com intensidade. Nascimento e morte têm o choro como seu fundo musical.

Tão presente é o choro que, às vezes, lançamos mão dele conscientemente para atrair a piedade ou até para vender uma falsa impressão a nosso respeito. Nas CPIs recentes, vimos políticos e empresários jurar inocência inexistente em meio a lágrimas tão copiosas que tiveram de interromper por instantes seus depoimentos. É como se o choro autenticasse a inocência. É o choro estratégico, para enganar, como o de Dalila quando pediu a Sansão que lhe revelasse seu segredo (Juízes 14:16).

Quando Jesus profere as Suas bênçãos no chamado Sermão do Monte, ele inclui os que choram, mas os que choram por reconhecer as suas limitações e por desejar o consolo que vem de Deus.

• Bem-aventurados os que choram de luto, por terem perdido pessoas queridas, tragadas pela morte, que é sempre brutal e deixa sempre um vazio sem fim, como os que ficam também estivessem morrendo aos poucos. Chorar a morte de uma pessoa querida (João 11:35) é um tesouro que nenhum humano pode abandonar, em nome de qualquer disposição, chamada de compostura, coragem ou o conformação.

• Bem-aventurados os que choram de saudade, porque distanciados dos seus queridos, afastados para longe, voluntária ou involuntariamente, como se também estivessem junto aos rios da Babilônia, sentados e chorando de saudade de Sião (Salmos 137:1).

• Bem-aventurados os que choram porque perderam coisas importantes, como aqueles que ficaram sem suas casas por causa de tempestades da natureza ou foram privados de seus automóveis em acidentes ou tiveram levados bens valiosos em assaltos.

• Bem-aventurados os que choram por causa da dor que corta seus corpos ou mentes ou mentes ou corpos de seus queridos. Há diagnósticos que fazem chorar. Há cirurgias que fazem chorar. Há tratamentos que fazem chorar. Há sofrimentos para os quais não há terapia alguma, a não ser a do choro. Há leitos de hospitais que parecem eternos. Há doenças que prenunciam o fim. Há doenças que produzem a sombra da morte, como foi o caso de Ezequias, que contraiu uma doença letal (Isaías 38:3).

• Bem-aventurados os que choram por não recuperarem o perdido encanto pela vida. As lutas vão drenando as energias, deixando a lágrima em seu lugar. As decepções vão minando a vontade de viver, deixando o choro como mergulho possível. As perdas acumuladas vão alimentando a tristeza ou a depressão. Não há tempo para o sorriso, só para o lamento (Salmos 6).

• Bem-aventurados os que choram por experimentarem a tragédia da rejeição, do esquecimento, da ingratidão ou do abuso. Há pessoas que sofrem e choram por não serem amadas, como todo ser humano deve. Há pessoas que sofrem e choram por não se sentirem amadas pelos outros. Há pessoas que não conseguem imaginar um Deus que as ame. Há pessoas que vivem como que esquecidas num depósito de corpos. Para essas pessoas, a única manifestação que lhe é permitida é o choro, muitas vezes silencioso.

• Bem-aventurados os que choram porque estão sendo perseguidos por causa da sua fé ou por causa das conseqüências da sua fé. Crer é um verbo que se conjuga na contramão. Quem faz o trabalho do Senhor, às vezes, se esquece que sua atuação pode ser molhada pelas lágrimas. Bem-aventurados os que choram por fazerem o trabalho do Senhor, mesmo que em meio a lágrimas do sacrifício provocado pelo peso do trabalho ou pela incompreensão daqueles que recebem os benefícios do que se faz (Salmos 126:5-6).

• Bem-aventurados os que choram de indignação contra toda forma de injustiça, miséria e violência. Quem está acostumado a aceitar o fruto do pecado como aceitável não chora. Bem-aventurados os que choram quando a espada da fome, da sede, da insegurança é fincada no corpo de um fraco, seja parente, amigo ou desconhecido. Benditos os que choram de indignação.

• Bem-aventurados os que choram por não conseguirem dar o passo ou os passos que precisam para uma recuperação, para a restauração da imagem de Deus em seus corpos e almas.

• Bem-aventurados os que choram arrependidos do seu pecado. Como diz uma antiga canção, o chorar não salva; de igual modo, apenas sentir-se indigno não salva, mas o arrependimento é o primeiro passo para a salvação. Quando pecamos, precisamos chorar arrependidos, como Davi, após o adultério com Batseba.

domingo, 5 de setembro de 2010

A ressurreição do respeito

por Ariovaldo Ramos

“A mulher que me deste por companheira, ela me deu da árvore, e comi” Gênesis 3.12.

Deus colocou o casal humano no jardim (Gn 2.8), estavam nus e não se envergonhavam (Gn 2.25), olhavam-se um como extensão do outro, não havia nenhum tipo de constrangimento entre eles.

Entendo que a ausência de constrangimento demonstrava a unidade deles. Um se via no outro. Havia entre eles um profundo respeito, uma vez que a convivência era harmoniosa. O que só é conseguido quando há respeito.

Respeito é mais do que não beligerância, trégua ou tratar alguém de maneira educada, polida. É profunda consideração pelo outro. Pessoas que se respeitam, honram-se mutuamente ou, no dizer de Paulo: “sujeitam-se um ao outro” (Ef 5.21). O respeito dignifica e enobrece qualquer relacionamento, assim como a sua ausência o vulgariza e empobrece.

A frase em epígrafe, dita pelo homem em seu relatório a Deus, atesta que a primeira conseqüência da queda, para o relacionamento humano, foi a perda de respeito entre homem e mulher. Quem respeita não usa o outro como bode expiatório para os seus problemas. Lamentavelmente, não só foi a primeira conseqüência, como, a julgar pela realidade da sociedade em que vivemos, tornou-se o padrão da maioria dos casamentos ora observados.

Curiosamente, a falta de respeito não inviabiliza, à primeira vista, um relacionamento, isto é, duas pessoas podem continuar juntas ainda que não se respeitem. A qualidade do relacionamento será, no mínimo, sofrível, porém, ainda possível.

O desrespeito pode assumir várias formas, das mais sutis às mais agressivas. Não é incomum, por exemplo, casamentos que se mantêm por décadas sob um conflito constante, que pode, inclusive, envolver maus tratos físicos.

A forma mais sutil de desrespeito é a dos ataques verbais, que podem ir de irritantes a grosseiros. Irritantes são os ataques verbais que denotam que o casal esta sempre se provocando ou, às vezes, praticando um duelo intelectual ou emocional, onde cada palavra é vista como o desferir de um ataque que merece imediata retaliação. Já os ataques grosseiros se caracterizam pela simples vulgaridade e pela violência verbal.

Ainda que pareça haver seres humanos que nutrem uma forma mórbida de amor, entendo que o desrespeito não pode grassar num ambiente de verdadeiro amor. Onde há falta de respeito o amor já foi embora ou, no mínimo, está em estado convalescente. O apóstolo Paulo disse: “o amor não se conduz incovenientemente” (1Cor 13.5), ou seja, o amor não falta com o respeito.

A falta de respeito é conseqüência do desprezo pelo outro, que, por sua vez, decorre da falsa conclusão, por parte do desrespeitoso, de que, de alguma forma, lhe é superior. Essa falsa ilação pode advir das mais diversas situações: despreza-se perdedores, gente que não conseguiu vencer na vida, um marido que não conseguiu ser o provedor da casa; despreza-se pecadores, gente que traiu o cônjuge - muitas vezes o traidor até é perdoado, pelo menos aparentemente, mas, com o tempo, acaba-se por perceber que o perdão foi apenas uma forma doentia de manter a pessoa sob tortura emocional – há relacionamentos que são mantidos por mera vingança; despreza-se gente que não acompanhou a evolução intelectual, financeira ou emocional do cônjuge; despreza-se gente que perdeu-se no padrão estético, marca dessa sociedade cultora do corpo. Ainda que as raízes do desprezo pareçam ser múltiplas, penso que há uma causa anterior.

A queda do homem é descrita como resultado de um ato de desobediência, o ser humano caiu por comer da fruta que Deus lhe proibira comer, a fruta que lhe daria conhecimento do bem e do mal. Não que o homem desconhecesse a diferença entre o bem e o mal! A criatura bem o sabia; se alguém, no Éden, perguntasse ao primeiro casal o que era e o que não era permitido fazer, isto é, a diferença entre o bem e o mal, certamente, receberia como resposta algo assim: “é permitido comer de todas as frutas (o bem) exceto da fruta da árvore do conhecimento do bem e do mal (o mal).” Acontece, porém, que o conhecimento que nossos primeiros pais tinham do bem e do mal vinha de Deus, isto é, era o Criador quem determinava o que era bem e o que era mal. O que foi oferecido ao casal original foi a possibilidade de, cada um deles, tornar-se a sua própria referência de bem e de mal, livrando-se assim, aparentemente, da exclusividade hegemônica de Deus.

Ao aceitar a oferta, a humanidade não só perdeu a comunhão com Deus, fonte de eterna sabedoria, como inaugurou um estado de guerra: cada ser humano, ao se tornar sua própria referência de bem e de mal, decretou guerra ao próximo, uma vez que o que um chama de bem o outro pode muito bem chamar de mal. Não bastasse isto, cada pessoa, não contente em ser a sua própria referência de bem e de mal, quer universalizar-se como referência. Eis a gênese da beligerância, a começar pela família: cada qual quer impor a sua vontade, o seu padrão, logo, está deflagrada a guerra. O primeiro ato de guerra é o desrespeito.

Para debelarmos este estado de desrespeito temos de nos converter ao Senhor, de modo que Ele volte a ser a única referência de bem e de mal para nós, assim como temos de nos converter um ao outro, de maneira que retomemos o caminho para a unidade. O converter-se ao Senhor faz com que a Sua vontade e o seu “modus operandi” se tornem nossos paradigmas, dessa forma nosso perdão será real, nossa paciência com o tempo de amadurecimento do outro será plena e nosso amor incondicional. O converter-se um ao outro faz com que a paz com o cônjuge ou com o próximo se torne prioritária, se torne o juiz de todas as nossas decisões, de modo que não ousemos dizer ou fazer qualquer coisa que tolde o relacionamento. O resultado de tal conversão é o restabelecimento de um estado de mútuo respeito.
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