sábado, 26 de fevereiro de 2011

Descobrindo a sua vocação - Amando o seu trabalho

por Jim Mathis

Ouvi dizer certa vez que a gente deveria encontrar algo que amasse fazer e à qual se dedicaria com ou sem pagamento e, só depois, procurar quem lhe remunerasse por tal tarefa. Muitos atletas, músicos, comediantes, escritores, fotógrafos, guardas florestais, instrutores de esqui, guias turísticos e motoristas profissionais, com certeza admitiriam que este teria sido o seu melhor projecto. Outros concordariam que amar o que fazem foi um dos maiores motivos para a escolha de suas profissões.

Tive três carreiras distintas e cada uma delas foi o resultado de um "hobby" ou de uma vocação, que acabou tornando-se em profissão. Comecei como músico profissional e me admirava pelo facto das pessoas pagarem para eu me divertir. A seguir veio a fotografia, quando o meu desejo de financiar um "hobby" se transformou numa carreira de 25 anos. Finalmente, o meu amor a Deus e ao próximo tornou-se uma actividade vocacional, junto a profissionais e homens de negócios. Se eu vier a ter mais uma ou outra vocação, antes que os meus dias de trabalho findem, estou certo que terão ligação com algo que eu ame, caso contrário, não conseguiria desempenhar a tarefa por muito tempo.

Lições da vida de um Rei


O rei Salomão, cuja vida é contada na Bíblia, foi considerado o homem mais sábio que já viveu. Foi também um dos mais ricos de toda a história. No fim de sua vida, escreveu sua história contando o que havia aprendido. Falando francamente de seus sucessos e fracassos, encorajou seus leitores a aprenderem com o seu exemplo. Sua história é chamada de "Eclesiastes", e no capítulo 3, versos 12-13, ele escreve:

"Então entendi que, nesta vida, tudo o que a pessoa pode fazer é procurar ser feliz e viver o melhor que puder. Todos nós devemos comer e beber e aproveitar bem aquilo que ganhamos com o nosso trabalho. Isso é um presente de Deus."

Um outro escritor, o apóstolo Paulo, escreveu em Colossenses 3:23: "Trabalhem arduamente e de bom ânimo em tudo quanto fizerem, tal como se estivessem trabalhando para o Senhor e não simplesmente para seus senhores."

Há um conceito errado, entre aqueles que crêem em Deus, de que o trabalho é um "mal necessário" – uma punição pelo pecado. Porém, o primeiro livro da Bíblia afirma que o trabalho existia antes do pecado (Génesis 2.15). A Adão e Eva foram confiados os cuidados com o Jardim, antes que cometessem seu primeiro pecado. Deus espera que trabalhemos e o trabalho deve ser algo que amamos fazer com entusiasmo.

Descobrindo a sua “chamada” – Reconhecendo Suas Paixões

Deus criou cada um de nós para um propósito. Ele criou cada indivíduo como um ser único, com um conjunto específico de traços de personalidade, dons e interesses ou paixões. Costumamos chamar a estas características de "chamada". Descobrir a sua "chamada" é um passo importante para amar o trabalho que faz. Muitos de nós, infelizmente, tivemos nossas paixões roubadas há muito tempo. Encontrá-las, às vezes pode transformar-se numa autêntica expedição arqueológica. Uma certa consultora vocacional costuma pedir aos seus clientes que escrevam suas autobiografias, para que possam descobrir onde perderam suas paixões.

Uma boa pergunta: "O que faria se não estivesse apreensivo?" A frase, "Não tema" aparece na Bíblia 365 vezes -- uma para cada dia do ano! Deus mostra-Se sério sobre o Seu mandamento sobre não ficarmos temerosos -- com relação ao nosso futuro, às nossas necessidades ou ao nosso trabalho.

Se se sente intranquilo no seu trabalho, ou crê que se sentiria mais realizado fazendo alguma outra coisa, fazer a si mesmo as perguntas abaixo, poderia ser uma boa maneira de reavaliar a "chamada" de Deus para sua vida e trabalho:
• Qual é a sua paixão? O que ama fazer tem significado, é recompensador?
• Você deixou que alguém ou alguma circunstância "roubasse" sua paixão?
• O que faria, se não estivesse apreensivo?

Jim Mathis
________________________________________
O Sr. Jim Mathis e sua esposa, Louise, vivem em Kansas, USA. Ex-empresários especializados no processamento de fotografias em branco e preto, trabalham juntos e fazem parte da equipe da CBMC em Kansas City.

domingo, 20 de fevereiro de 2011

A Dádiva do Presente: Aos 33


Por Paulo Nascimento

And you run and you run to catch up with the sun, but it's sinking
And racing around to come up behind you again
The sun is the same in a relative way, but you're older
Shorter of breath and one day closer to death

Time, Pink Floyd)

Ontem (25/07) eu ouvi o antropólogo brasileiro Roberto DaMatta, em entrevista à Marília Gabriela, dizer que há quatro anos, quando da morte de seu filho mais velho, encontrou nos livros o alento que lhe ajudou a mitigar a dor da perda. Mais do que o alento psicológico, DaMatta dizia ter experimentado com os livros um sentimento de esperança, e certa convicção de que a morte não teria a última palavra sobre a vida. Teria DaMatta lido a Bíblia? Não sei. Ele mesmo não o disse.

Hoje também eu perco um pedaço da vida. Rubem Alves tem razão quando diz que 76 são os anos que ele não tem mais. Quando nos perguntam nossa idade tendemos a dizer: “tenho 20 anos”, ou “tenho 33 anos”, ou “tenho 60 anos”. Nos equivocamos! Nasci em 26 de julho de 1977. Portanto, 33 são os anos que já não tenho, posto que se foram. Quantos ainda tenho? Não sei! Mas 33 são exatamente aqueles que me escaparam por entre os dedos hoje!

Eu quis fazer como Roberto DaMatta. Fui mitigar minha perda nos livros. E reencontrei um santo e um herege que me ajudaram.

Santo Agostinho é autor de uma belíssima meditação sobre o tempo no seu Confissões [Livro XI, O Homem e o Tempo]. Muito antes de qualquer Psicologia ou de qualquer Teoria da Relatividade, o bispo de Hipona nos persuadiria acerca da relatividade do tempo e da natureza subjetiva de sua produção. O que temos, conforme Agostinho, é um “eterno hoje”. Porque nem o passado nem o futuro existem, exceto como memória e expectação, respectivamente. O que nos sobra é a eternidade de cada momento. Não é curioso que exatamente essas coisas que não existem mais, sejam justamente aquelas que turvam em nossos olhos a dádiva do presente? Não é curioso que o passado seja o demônio de muita gente? Não é curioso que a expectação do futuro torne sem graça a dádiva do presente para muita gente? “Esquecerei as coisas passadas. Preocupar-me-ei sem distração alguma, não com as coisas futuras e transitórias, mas com aquelas que existem no presente”, concluía Agostinho.

A expressão “dádiva do presente” é de Rubem Alves em Towards a Theology of Liberation [no Brasil, Da Esperança]. É dita no contexto de uma advertência a todos os revolucionários, sejam teólogos, políticos, acadêmicos, etc. Porque nos parece que onde quer que um espírito revolucionário aporte, o presente precisa ser sacrificado em nome da construção do futuro. Parece-nos que no caminho para “outro mundo possível”, o presente precisa ser domesticado, negado, sacrificado em prol da luta e da militância. Perde-se assim o sentido erótico da vida, que só pode ser fruído como um Agora dadivoso. Para Alves, ao fruir a dádiva do presente “a pessoa está livre para as coisas simples da vida, coisas que não produzem manchetes nem mudam o mundo. Livre para conversar, para beber e comer, para fazer nada, em pura contemplação, para desfrutar o jogo do sexo, para brincar”. Assim, sem perder a dimensão da utopia que move nosso caminhar, a dádiva do presente, cheia de paixão e de erotismo, nos torna pessoas mais leves e menos ressentidas.

Foi aos 33, segundo os evangelhos, que Jesus de Nazaré morreu na cruz romana. Mas como pôde, consumiu fartamente do eterno hoje. Também não deixou esvair-se a dádiva do presente. Plantou as sementes de um mundo diferente a que nominava Reino de Deus, que é uma imagem arquetípica da sociedade marcada pela humanização plena de todo mundo. Mas enquanto o Reino não chegava, foi às festas do povo e não permitiu que a alegria acabasse junto com o vinho que findou. Foi chamado de comilão e de beberrão e não retrucou. Embrenhou-se entre pobres e prostitutas, que, ao que nos consta, dificilmente conversam sobre política.

Em Tempus Fugit Rubem Alves descreve o medo que lhe dava o relógio de parede na casa de seu avô. “Eu tinha medo. Hoje, acho que sei por quê: ele batia a Morte”, explica. De modo semelhante diz um verso do Pink Floyd: The sun is the same in a relative way, but you’re older / Shorter of breath and one day closer to death.

Mais próximo da morte, sim. Mas sem medo algum. Trabalhando por outro futuro possível, sim. Mas fruindo o eterno hoje e a dádiva do presente. Aos trinta e três!

+++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++++

Paulo Nascimento é baiano de Muritiba, terra de Castro Alves. É casado com Patrícia Nascimento e sem filhos. Também é Bacharel em Teologia pelo Seminário Teológico Batista do Nordeste (Feira de Santana-BA) e graduando em Psicologia pela Universidade Federal de Alagoas. Além disso, é pastor batista em Maceió e professor de Teologia Sistemática no Seminário Teológico Batista de Alagoas. É autor de Ópio coisa nenhuma: Ensaio de Teologia Crítica a partir de Alagoas.

sábado, 12 de fevereiro de 2011

Estou frustrado!


por Alex Amorim

O relato abaixo é um desabafo. Você não precisa ler se não quiser, na verdade, acho que pensei em voz alta, ou melhor, pensei de forma escrita.

Não gosto de mostrar minhas dificuldades, nem de contar minhas fraquezas, aliás este é o motivo de estar escrevendo, não gosto de ser quem sou, estou frustrado...

Veja bem, não estou frustrado com o mundo que em pleno século XXI ainda não aprendeu a resolver suas diferenças. Minha frustração não é com o medo que o terrorismo tem espalhado pelos quatro cantos, nem mesmo com o absurdo de dinheiro gasto em uma guerra de motivos, no mínimo, duvidosos.

O verdadeiro motivo de minha frustração não está no Brasil, embora a miséria e o desemprego roubem muito da minha motivação e os políticos com sua corrupção e pilantragem, minem minha esperança de um futuro melhor. Não é uma frustração por crer que os problemas do país são tão culturais, estruturais e religiosos que meras medidas políticas não conseguirão resolvê-los.

Tampouco estou frustrado com o cristianismo ou seja lá no que ele se transformou nesta nossa era pós-reforma. Confesso que muito me espanta ver as milhares de novas igrejas que surgem todos os anos, muitas delas fruto de “uma nova revelação de Deus”. Também não posso aceitar ver a mensagem de fé sendo trocada pela mensagem do pensamento positivo. É difícil ver igrejas organizando congressos de valorização da identidade denominacional em contraste com a mensagem de unidade deixada por Jesus. Quero dar um grito contra a politização dos púlpitos. É inaceitável pra mim os pactos políticos realizados por muitas igrejas, mas ainda não tem sido o cristianismo o motivo que tem consumido minha alma.

Também não é minha igreja que tem me frustrado, embora me irrite ver a forma desleixada que muitos membros dela têm vivido. Embora doa ver que muitos dos que deveriam ser mestres continuam como recém-nascidos. Ainda que eu saiba que muitas vezes cedemos à tentação e deixamos de lado a mensagem cristocêntrica por mensagens mais agradáveis.

Tudo isso me chateia e por vezes tira a minha força, mas minha maior frustração é comigo mesmo e a máscara que tenho carregado. Eu não sou quem você pensa e confesso que às vezes nem eu mesmo sei quem sou. Me sinto tão bem com esta máscara, ela se encaixou tão bem em mim que já faz parte do que sou.
Não sei exatamente quando tudo isso deu início, acho que comecei a experimentá-la quando ainda era criança: tentava não chorar quando sentia dor, procurava ficar quieto quando na verdade queria fazer bagunça. Mas era tudo muito simples, tudo sob controle. Eu podia voltar a ser quem era a qualquer momento.

Na adolescência, minha necessidade de aceitação me fez usá-la com mais frequência. Devia ter notado que estava ficando viciado nela. Devia ter parado, mas tive medo do que os outros pensariam então, como o homem da máscara de ferro, fiquei trancafiado dentro dela.

Entenda, minha máscara não é feia, eu escolhi bem. Ela demonstra espiritualidade, santidade, inteligência, bom caráter e coisas deste tipo. Às vezes pareço intelectual e outras vezes consigo até ser engraçado. É o que os outros esperam de mim, ou pelo menos, o que eu acho que esperam.

Porém, hoje meu pecado, minha arrogância e meu orgulho chegaram num limite que começaram a me sufocar levando-me a uma dramática decisão: ser consumido por eles ou quebrar a máscara e mostrar minha verdadeira face?
Não estou muito certo se quero ver a imagem por baixo desta casca, mas sei que não tenho outra opção se quero continuar vivendo. Então, com coragem começo a quebrá-la. Não vou usá-la mais, nunca mais...

Pedaços vão caindo e começo a ver o que há anos estava escondido. Pra minha decepção, o que vejo não me espanta. É a mesma imagem de anos, a mesma imagem de sempre...

Mesmo doente, pareço são.
Mesmo triste, me vejo sorrindo.
Mesmo na minha confissão, tento me mostrar santo.
Estou frustrado.

“Senhor, Tu me sondas e me conheces” Sl. 139:1.

sábado, 5 de fevereiro de 2011

"Bem-aventurados os pobres de espírito, porque deles é o Reino dos Céus"

Por Carlos Queiroz

Vivemos numa sociedade marcada pelo pragmatismo, sucesso como sinal da interferência de Deus e progresso econômico como referencial de bênção. Mas, para quem vive ou trabalha entre os pobres esses sinais pouco, ou quase nunca, se manifestam. Por conta disso, caímos no desânimo, desencanto, frustração, e muitas vezes, em desespero. Alguns projetos sociais que acompanhei em Angola foram, literalmente, destruídos da noite para o dia, por causa da guerra. Causou dor no peito ver o que havia sido construído em dois anos ser consumido pela brutalidade desumana em apenas algumas horas, nas caladas da noite. Situações adversas sempre surpreendem quem vive engajado na luta em favor dos pobres. E, muitas vezes, chegamos ao ponto de desanimar. Todavia, mais do que resultados imediatistas materiais, guardo comigo os frutos da minha própria humanização apreendida a partir do pobre. Coisas boas sempre vão acontecer, mesmo em circunstâncias adversas. Quero animar você a não desistir, a continuar sonhando, a fazer do Reino dos Céus a possessão dos realizados com a vida, por serem pobres de espírito. Vamos juntos buscar algum entendimento, sobre o que Jesus queria nos ensinar, ao anunciar a felicidade dos pobres de espírito.

Há uma tendência de se espiritualizar a interpretação da palavra "pobre" nas Escrituras. É evidente que a Bíblia não fala de pobre dando somente uma conotação econômica e social. O pobre é apresentado também como uma disposição interior ou atitude de alma , que se coloca sob a total dependência de Deus. Mesmo assim, a maioria das palavras hebraicas usadas na Bíblia, para designar "pobre" tem em seu conteúdo literário a idéia de "pobre" como pessoa desprovida de bens materiais ou oprimida pelos ricos e poderosos. Nestes casos, em geral, os documentos, principalmente dos profetas, falam muito mais do juízo de Deus, em relação aos que provocam a injustiça do que da situação dos que a sofrem. Claro, que fica sempre evidente a parcialidade de Deus, do lado do pobre injustiçado, mas não se pode perceber em nenhum momento que eles sejam felizes porque foram injustiçados. Aliás, sob a lógica da sobrevivência, é necessário um milagre tremendo para se imaginar alguém em condição de felicidade por causa da pobreza. Além de outros males, a pobreza gera revolta, indignação, às vezes blasfêmia; na mesma proporção em que a riqueza também gera indiferença e materialismo idólatra.

Nos manuscritos mais antigos do texto de Mateus não se encontra o complemento: "de espírito", que a maioria dos tradutores preferiu acrescentar. E, tudo nos faz crer que não houve equívoco. Deram ao texto o sentido mais próximo daqueles, a quem Jesus estava denominando de pobre. Não era apenas o desprovido economicamente, o socialmente marginalizado, o psicologicamente oprimido. Pobre, no novo conceito de Jesus implicava numa condição de alma, num estado de espírito, numa nova atitude em relação a Deus. Jesus está falando de pessoas que confiam exclusivamente em Deus; sendo que a razão dessa confiança vem como resultado da incapacidade de confiar em si mesmas, pois não dispõem de prestígio, influência social e poder. Quem são geralmente, as pessoas com essas características, senão principalmente as pobres?

Portanto os "pobres" para quem Jesus foi ungido a evangelizar (Lc. 4:18), para quem são dadas as bem-aventuranças (Mt 5:1-12) para quem o evangelho é revelado (Mt 11:28), são os indigentes, carentes, fracos, sob humilhação, são os que trabalham dignamente e possuem somente o trivial, são os que vivem em condição de miséria absoluta. São ainda os cidadãos do Reino de Deus que, desprovidos de qualquer socorro humano e material, recorrem exclusivamente ao socorro de Deus. E por isso são felizes, conforme o Sermão do Monte; felizes por não acumularem tesouros na terra, onde a traça e a ferrugem corroem. São felizes porque foram cativados a servir, em adoração a Deus e amor ao próximo. Felizes por encontrarem a alegria do SER - a fonte onde a infelicidade não existe. Na escolha entre Deus e as riquezas, preferiram Deus; pois, segundo Jesus Cristo não é possível servir-se aos dois ao mesmo tempo. Em geral, as riquezas escravizam, reduzem as pessoas a serem devotas do ídolo do mercado. A grande maioria perde a sensibilidade humana, tornando-se pessoas avarentas, egoístas, enfim longe da felicidade que É. Do mesmo modo, podemos ter pobres, economicamente pobres, cuja esperança está prepotentemente enraizada na possibilidade de sua inclusão e aceitação pelo mercado, e não na esperança em Deus. Alguns por terem a riqueza adoram-na como ídolo; outros não a tem, mas põem nela toda a sua esperança, e tanto estes quanto aqueles, são miseráveis, pobres de fato, cegos e nus – são infelizes.

Felizes os pobres de espírito. Entre eles encontro aqueles que vão em busca do pobre sem dinheiro, do pobre que teve o direito usurpado, do pobre sem acesso a escola, sem lugar para morar, sem terra para cultivar o pão nosso de cada dia. Esses que vão aos pobres, dia a dia, trabalhando em creches, associações de bairros, entre os sem terra, sem teto - muitas vezes vão com a alma vazada de indignação com os dirigentes dos órgãos públicos, desencanto com a indiferença dos religiosos, alimentando-se do desespero de não perceber seus sonhos concretizados, e a despeito de tudo, são felizes. Felizes por terem sua sensibilidade humana redimida - os pobres nos humanizam. Felizes por terem uma decodificação do Evangelho simplesmente explicita no cotidiano do pobre - entre os pobres o Evangelho se enraíza. E assim, entre os pobres, o pobre de espírito recebe a revelação de que toda a esperança da vida não está no bem de capital de quem o possui, nem na expectativa de possuir algum dia, qualquer bem material. Entre os pobres, sem prestigio, fama, reconhecimento e poder, o pobre de espírito se percebe desnudo de qualquer riqueza - até mesmo da chamada riqueza espiritual, e diante da consciência de que nada possui, decide confiar exclusivamente na graça de Deus - e por isso, é especialmente feliz. Fora da Fonte encontra-se a infelicidade de não-ser, e aí está a tristeza eterna de muitos.

Continuemos entre os pobres alimentando sonhos e esperanças, mas acima de tudo sendo por eles humanizados e re-evangelizados, para que a nossa bem-aventurança seja completa na ressurreição de nossa humanidade.

Carlos Queiroz
Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...