sábado, 29 de dezembro de 2012

Para não viver em vão


Por Ricardo Gondim

Publicado em 4/06/2012

Para não viver em vão é preciso oscilar entre as margens do bem e do mal, do ódio e do amor, da delicadeza e da estupidez. Por algum motivo, a sabedoria milenar acertou: a virtude pertence aos moderados. Nem tanto ao mar, nem tanto à terra.
Para não viver em vão é preciso flutuar com leveza. Se necessário, encher os pulmões de nitrogênio e acompanhar o voo dos balões. E se o desejar as altura for inevitável, não deixar que o fascínio das nuvens roube o acocorar-se ao lado de quem está agrilhoado à crueldade da vida.

Para não viver em vão é preciso levar-se a sério. Mas não com tanta gravidade. Alguns, impertinentes, deixam a impressão de que a virtude é incômoda – como uma mala sem alça. Tem hora que é bom viver sem propósito, ao sabor dos ventos. Por que não celebrar a improdutividade? Por que não aplaudir as cigarras? Seriam as formigas, que seguem em fila sem notar que obedecem a rainha, o melhor exemplo?

Para não viver em vão é preciso vez por outra desentrevar a espiritualidade de protocolos solenes. O cerimonialismo torna a fé um assunto para gente sisuda. Que alívio considerar Deus “um cara muito legal”, compreensivo, longânimo e que não mete medo. Que tal ensinar que Deus gosta de tornar qualquer um íntimo seu?

Para não viver em vão é preciso evitar varrer a inveja para debaixo dos tapetes do cinismo, assumir-se sem afetação, procurar o próprio caminho; e ter coragem de cantar no banheiro.

Para não viver em vão é preciso acordar tarde, comer chocolate sem culpa, presentear perfume caríssimo, sentar para almoçar sem hora para acabar, desligar o telefone celular, conversar um monte de besteira, rir à solta e ler romance.

Para não viver em vão é preciso acompanhar algum esporte, aplaudir trapezistas, sofrer com equilibristas, vibrar com contorcionistas, crer em mágicos e rir de palhaço; claro, gostar de circo.

Para não viver em vão é preciso ladear aquele que se desgasta pela justiça e reverenciar quem não se deixou entrevar pelo narcisismo; não confundir solidariedade com comiseração.

Para não viver em vão é preciso fazer da prece um compromisso, das convicções uma porta para o diálogo e da fé um convite para encarnar o divino.

Para não viver em vão é preciso fazer do instante fugidio um aceno de eternidade, da liberdade um compromisso com o próximo e da discordância uma oportunidade para crescer.

Para não viver em vão é preciso coragem para pedir perdão.

Soli Deo Gloria

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