domingo, 10 de outubro de 2010

Cristianismo e Política

Por Artur Gueiros

O Evangelho, o senhorio de Cristo, se espraia por todos os aspectos de nossas vidas. Tudo pode e deve ser utilizado pelo cristão como instrumento de graça, como materialização do amor: um sorriso, um email, um olhar, um blog, um livro, um tweet, um abraço, um olá e, da mesma forma, a política. Ela nada mais é do que a ferramenta na qual as relações de poder se estabelecem; não se restringe a voto, candidatos, congresso etc, mas abrange o nosso dia-a-dia, nossas decisões, nossos posicionamentos.

O partido de Cristo é o Reino, seus valores são o parâmetro, e o objetivo final é a glória de Deus. Num estado democrático, a política é o instrumento pelo qual se dão as maiores e mais abrangentes transformações para o país. Toda e qualquer demanda ou pressão exercida pelos diversos atores sociais tem, necessariamente, que desembocar na política institucional para que tome forma legal atingindo, assim, todos os cidadãos. Como servos do Altíssimo, deveríamos buscar desenvolver um maior interesse pela política, explorar seu potencial como instrumento de transformação da realidade, refletindo os valores de Deus na sociedade.

A política deve ser cuidada pelos cristãos, aperfeiçoada, bem utilizada, e não, desdenhada. O fato de candidatos e partidos caírem em erro, não deveria nos surpreender; não temos nenhuma ilusão quanto ao estado de total depravação do homem e à luta contínua contra o pecado que tenazmente nos assedia. Pelo contrário, nossa relação com Deus - ao expor nossas fraquezas - nos impulsiona a aperfeiçoar a política, de maneira a dificultar que a ganância, a vaidade e o egoísmo humanos tenham espaço nas estruturas econômicas e sociais, gerando fome, miséria e dor. Nosso relacionamento com o Pai deve nos mover para políticas públicas que corrijam a vil miséria que insulta os céus, caso contrário, as pedras continuarão clamando, e o Senhor continuará usando ímpios para realizar a tarefa que nos foi endereçada. Multipliquemos, pois, o talento que nos foi confiado. Mas, chegando também o que recebera um talento, disse: Senhor, eu conhecia-te, que és um homem duro, que ceifas onde não semeaste e ajuntas onde não espalhaste; E, atemorizado, escondi na terra o teu talento; aqui tens o que é teu. Respondendo, porém, o seu senhor, disse-lhe: Mau e negligente servo; sabias que ceifo onde não semeei e ajunto onde não espalhei? Devias então ter dado o meu dinheiro aos banqueiros e, quando eu viesse, receberia o meu com os juros. Tirai-lhe pois o talento, e dai-o ao que tem os dez talentos. Porque a qualquer que tiver será dado, e terá em abundância; mas ao que não tiver até o que tem ser-lhe-á tirado. Lançai, pois, o servo inútil nas trevas exteriores; ali haverá pranto e ranger de dentes.Mt 25:24-30.

Preocupamos-nos mais com as conseqüências: aborto e homossexualismo, do que com as causas - objetização da mulher na mídia, abuso sexual de crianças, tráfico de seres humanos, qualidade dos programas de TV, desigualdade e opressão no campo e na cidade, exploração no trabalho, impostos injustos, juros bancários extorsivos, destruição da natureza. Enquanto Corpo de Cristo, temos que ser a materialização do amor de Deus na sociedade que nos cerca (na qual deveríamos estar inseridos), mostrando através das boas obras - “Pois somos feitura dele, criados em Cristo Jesus para boas obras, as quais Deus de antemão preparou para que andássemos nelas.” -, que Deus se importa e que tem um plano melhor para o mundo. O Eterno exige que identifiquemos o mal (Informa-se o justo da causa dos pobres, mas o perverso de nada disso quer saber. Pv. 29:7) e o combatamos, onde quer que se manifeste, pois praticar a justiça é alegria para o justo, mas espanto, para os que praticam a iniquidade. Pv 21:15.

Aborrecer o mal e colocar-se como prumo na construção de uma sociedade mais justa (Ai dos que decretam leis injustas, dos que escrevem leis de opressão, para negarem justiça aos pobres, para arrebatarem o direito aos aflitos... Is 10:1,2.) e mais amorosa (O lobo habitará com o cordeiro,...; o bezerro, o leão novo e o animal cevado andarão juntos, e um pequenino os guiará. Is 11:6) é um papel do qual não podemos nos furtar, e para o qual precisamos cultivar senso crítico e discernimento, fundamentais para a compreensão e a prática do Evangelho. A falta deles costuma gerar uma fé supersticiosa, cheia de medo, de dogmas e de autoritarismo, distinta da fé dinâmica vivida e pregada pelos reformadores (Ecclesia reformata semper reformanda).

Quando a igreja não tem discernimento histórico do seu papel, do que se passa no mundo, das correlações de força, das relações de causa e conseqüência, quando falta profecia (Pv 29:18), ela se afasta do pleno testemunho de Cristo. A Palavra e a história mostram que nem sempre a presença da igreja indica a presença de Jesus. Os tristes exemplos das igrejas segregacionistas no sul dos EUA e na África do Sul, bem como as igrejas que apoiaram e deram suporte aos golpes militares na América do sul revelam isto. Se temos hoje dificuldade em entender nosso papel e compromisso diante da injusta realidade brasileira, a resposta se encontra em parte na nossa própria história eclesial, que sepultou, a duros golpes, o pensamento crítico e a reflexão, fazendo com que os erros do passado se tornassem os dogmas que engessam a compreensão e transformação do presente. Cabe-nos trazê-los (crítica e reflexão) à vida novamente, para que o Senhor nos guie pelas veredas da justiça, por amor do seu nome. Pois em Cristo, um outro mundo é possível.
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Artur Leonardo Gueiros Barbosa
http://twitter.com/arturgueiros

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